
Uma História de Amor – O Arroz Doce e Mentira Mais Triste!
4 de outubro de 2017* Professora MSc. Joana Prado Medeiros
Para iniciar esta Coluna optei por publicar este texto em homenagem a meus pais. No presente ambos “In memoriam“
Era junho inverno não estava muito frio, mas o meu coração tremia. Você usava aquela blusa de lã que hoje quando estou bem triste, triste de querer sumir eu procuro por ela ou então durmo abraçada com a mesma.
Estávamos fora de casa para tratamento de saúde da sua saúde, estávamos na capital sul-mato-grossense. Você tinha um sorriso fraco e olhos brilhantes, a cada dor disfarçava com alguns gestos para me poupar… E eu soluçava e chorava escondido para você não ver.
Andamos de mãos dadas por aquelas pequenas ladeiras, ouvimos juntos pela primeira vez a canção Tocando em frente recém-lançada na voz do Almir Sater que dizia “Ando devagar porque já tive pressa é preciso à chuva para florir. E preciso amor pra poder pulsar” você prestou atenção na letra segurou minhas mãos e me olhou nos olhos e disse que música linda! Foi a última canção que você ouviu aqui neste planeta e hoje quando escuto fico enrugadinha de ti e sinto teu cheiro. Antes de chegarmos ao hospital você me presenteou com um livro para a vida toda nada mais nada menos que Cem Anos de Solidão do imortal Gabriel Garcia Marquez, fiquei feliz e triste apertava o livro no peito e apertava a sua mão.
No hospital você tão despedaçado fez o necessário exame, jorrava em sangue e eu chorava, ficamos grudados e no outro dia logo bem cedinho era apenas 5 horas da manhã você me disse que estava com vontade de comer arroz doce e eu me descabelei todo o tempo de trégua que tive naquele dia a procurar, encontrar uma tigelinha um pouquinho de arroz doce, reforço como justificativa calada e corroída que estava sozinha contigo no hospital no tempinho que dava eu fugia e pelos bares e restaurantes ao redor indagava se era possível comprar um arroz doce… Mas que nada! Não encontrei. Para piorar lá pelas tantas minha mãe ligou e você novamente pediu arroz doce, porém ela em outra cidade em desespero para sair logo de casa para ir ao seu encontro nem cogitou a possibilidade de realizar tal desejo.
E assim quando mais tarde a dor me bate feito açoite eu recordo pela milionésima vez que ao final da tarde comprei um danoninho para você comer e fui dizendo amanhã eu prometo conseguir o seu arroz doce.
E o amanhã chegou rápido demais, demais e demais não queria, mas chegou à primeira hora você foi para sala de cirurgia fomos de mãos dadas até onde deu… Você segurou minha mão e rezamos a oração que Cristo nos ensinou e você se foi… Foi anestesiado e abarrotado de amor e poesia… Foi para tão longe eu não sei onde fica… E ficamos na sala de espera a te esperar e minha mãe lá pelas tantas (estávamos de olhos espichados de medo e tristeza) me perguntou você conseguiu comprar o arroz doce para o seu pai? E eu respondi sim mãe eu consegui…
E ao longo desses 23 anos de saudades continuamente ela pergunta novamente e sempre você conseguiu dar o arroz doce para seu pai? Estava gostoso? É verdade mesmo? Eu reafirmo a mentira mais triste de minha vida. E minha mãezinha me olha com aquele olhar de amor com “aquele mesmo olhar do meu pai” que sabia entender minhas alegrias disfarçadas para lhe poupar sobre meu desespero.
Nunca confessei tal mentira. Marinei todo esse tempo tal culpa esta dor, a incompetente e frustrada busca por um pouco de arroz doce. Hoje, somente agora essa dor vazou dos meus olhos e caiu aqui no teclado.
Os pais são sábios! Deve haver perdão! Pai você foi para longe sei apenas vives em algum lugar, e habita em meus sonhos e realizações, em meus passos e meus sorrisos, você é a tradução do que sou.
Mãezinha do alto dos seus 86 anos com seus olhinhos cinza e com cataratas você me enxerga mais do que sei, obrigada por fingir que acredita em minha mentira… Choramos e lavamos nossas culpas, por fim é preciso paz para poder seguir.
* Professora MSc. Joana Prado Medeiros, douradense, graduada em História, especialista em História do Brasil, mestre em História e doutoranda em História. Professora na UNIGRAN Dourados (MS). Agora Colunista no Jornal MS Online.
Adorei…bom demais!
Li devagar pq já tive pressa…e foi escrito com a caneta da saudade…e tinta do coração. Parabéns.
Muito obrigada. Sim foi escrito com a alma.
Adorei…👏👏👏
Obrigada. Muito obrigada
Lembrei do meu pai que partiu a uns meses. O teu estilo é de fácil leitura e a gente se enxerga na situação descrita. Parabéns e muito sucesso a você, escritora amiga.
Muito obrigada. Geralmente narrativas de experiências vividas tem este poder.
A vida nos reserva esses momentos que nunca queremos passar. Meu pai e mãe já foram “antes do combinado” como diz Rolando Boldrin e a tristeza é imensa que nos deixa perplexos. Deus os leva ao seu paraiso.
Obrigada, por comentar. E
É isso a vida nos reserva alegrias e tristezas e devemos seguir. Abraços
Muito obrigada, te convido a ler o texto de amanhã quarta feira. Neste mesmo site e claro rarara. Abraços